Pesquisa
UFRJ faz pesquisa sobre rins com ratinho-goytacá
Rossana Ribeiro
Divulgação UFRJ
Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), composto por biomédicos, biólogos, veterinários, nutricionistas e estudantes de iniciação científica nas áreas de biologia, farmácia e medicina, além de especialistas em fisiologia, bioquímica, morfologia, zoologia, taxonomia, embriologia, biologia celular e biologia molecular, coordenados pelo professor Pablo Rodrigues Gonçalves, investigam o funcionamento dos rins tendo como modelo o ratinho-goytacá, uma espécie exclusiva do Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, em Macaé. “O principal objetivo é identificar se esse animal apresenta adaptações na função renal que permitam que ele viva em um ambiente com baixa oferta de água”, conta o professor Jackson Menezes, doutor em fisiologia pela UFRJ e especialista em sistema renal.
Segundo ele, o estudo propõe conhecer melhor a fisiologia desse roedor e gerar novos conhecimentos que possam garantir a preservação da espécie. “Com este estudo poderemos saber quais seriam as possíveis mudanças em seu hábitat original que impactariam diretamente a fisiologia desse organismo”, afirma.
Estudo
Os estudos tiveram início em 2008, e a espécie foi descrita em 2011 pelos pesquisadores William Tavares, atualmente doutorando do PPG-Genética−UFRJ, Leila Maria Pessôa, docente do Departamento de Zoologia do Instituto de Biologia (CCS−UFRJ), e Pablo Rodrigues Gonçalves, do campus UFRJ−Macaé.
“Obtivemos os primeiros exemplares em coletas no Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba e iniciamos as comparações com outras espécies do gênero Cerradomys para identificação taxonômica. As diferenças morfológicas e genéticas subsidiaram a descrição que foi publicada no periódico internacional Journal of Mammalogy”, conta Pablo, coordenador do projeto.
O projeto, que foi inicialmente pensado em três etapas, tem atualmente sendo executada a terceira etapa. “A primeira foi um levantamento do quantitativo de espécimes, realizado pela equipe do professor Pablo para sabermos se a retirada de seis exemplares (três machos e três fêmeas) do hábitat natural não iria impactar negativamente a população desse roedor na restinga. Após uma análise minuciosa de diversos parâmetros, foi constatado que isso poderia ser feito. A segunda foi a manutenção do animal em biotério para sabermos se o mesmo iria se manter vivo. Eles resistiram vivos por quase três meses, com sinais de boa saúde. A terceira etapa, a qual está sendo executada neste momento, é a reprodução, com os estudos da função dos rins”, relata Jackson Menezes.
A espécie foi escolhida, pois é um organismo representante do Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba que apresenta características de adaptação fisiológica às condições ambientais típicas de uma restinga. "O animal é capaz de viver em um ambiente com ampla variação de temperatura e com pouca oferta de água. O rim é o órgão responsável pelo balanço hidroeletrolítico no organismo, ou seja, é o órgão que regula a quantidade de água e sais que estarão disponíveis no plasma, entre outras funções. Nesse sentido, postulamos a hipótese de que o Cerradomys goytaca (ratinho-goytacá) possui adaptações da função renal para sobreviver em condições de baixa oferta de água, promovendo maior concentração da urina, que em última análise significa que o animal perde menos água para o meio externo através dela”, conta o professor.
Até que a função renal seja determinada, muita informação foi gerada e ainda está sendo. “Hoje já sabemos que o tempo de gestação desse roedor é de aproximadamente 21 dias. Sabemos também que o animal ingere em média 5 ml de água por dia e produz aproximadamente 3 ml de urina por dia. Os filhotes ficam com o corpo totalmente coberto por pelos após o quarto dia de vida. Com relação à função dos rins, já sabemos que eles produzem uma urina muito concentrada. Temos como perspectiva inicial realizar uma caracterização da função dos rins do ponto de vista funcional e morfológico, e, neste sentido, identificar as possíveis adaptações da função renal”, conta Jackson Menezes ao UFRJ Plural.
Dificuldades
Segundo Jackson Menezes, a principal dificuldade foi determinar as condições de temperatura, umidade do ar, oferta de alimento, de água, luminosidade do ambiente e o tempo dos períodos claro e escuro ótimos para a reprodução. O primeiro filhote nascido no biotério só aconteceu sete meses após a chegada dos três casais.
Mas as dificuldades foram superadas e foi possível a reprodução com muito trabalho, segundo o pesquisador. "Tivemos que realizar muitos testes das condições da sala onde eles vivem. Testamos item por item, em um trabalho que nos proporcionou excelentes resultados. Hoje, não diria que conhecemos as condições ótimas de reprodução, mas conseguimos reproduzir o ratinho-goytacá em um ambiente de biotério”, revela.
Curiosidade
De acordo com o professor Pablo Gonçalves, Cerradomys goytaca é a única espécie de mamífero no Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, que vive exclusivamente na região mais árida da restinga, que consiste em uma formação aberta com ilhas de vegetação em meio ao solo arenoso. Além disso, a coloração de sua pelagem o camufla facilmente entre as folhas secas do interior das moitas de vegetação, uma característica adaptativa interessante contra a predação nesses ambientes.
“Conversando com o professor Jackson, especialista em fisiologia renal, sobre essas características do ratinho-goitacá, decidimos iniciar uma investigação de outras possíveis peculiaridades fisiológicas da espécie ligadas à vida na restinga”, declara.
Outras pesquisas feitas em torno do animal
Atualmente, além dos estudos da função renal, estão sendo pesquisadas quais as melhores condições para a reprodução do animal em biotério, um estudo fundamental para que não necessite da coleta em seu hábitat natural. "Além disso, garantimos um reservatório da espécie que pode ser utilizado na recuperação de uma possível degradação ambiental que reduza muito o número desses roedores na natureza. Lembrando que esta é a primeira vez no mundo em que se mantém esse animal em ambiente de biotério por mais de dois anos, e com reprodução”, afirma Jackson Menezes.
Com relação à fisiologia renal, a equipe de pesquisadores está estudando neste momento a excreção urinária de solutos e de água. Com relação à reprodução, estão tentando determinar as fases do ciclo estral das fêmeas, que compreende a variação hormonal que elas apresentam ao longo de uma semana e que é fundamental para que ovule.
“Possuímos uma previsão de conclusão em janeiro de 2014, iniciaremos estudos para entender melhor a ingestão alimentar desses animais, ou seja, o quanto de cada nutriente é necessário para manter o ratinho-goitacá saudável. Além disso, iremos realizar estudos para caracterizar as funções cardiovascular, respiratória, gastrointestinal e endócrina”, diz Jackson.