Em Pauta
Contrassenso na Comissão dos Direitos Humanos e Minorias
Por Guilherme Karakida
Alexandra Martins /
Câmara dos Deputados
No dia 7 de março, o deputado do PSC-SP, Marco Feliciano, foi eleito como o presidente da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias (CDHM). Com declarações homofóbicas e racistas, além de um vídeo no qual pede a senha do cartão de crédito de um fiel, o pastor tem sido alvo de manifestações em todo o país, tanto nas redes sociais como nas ruas, exigindo a sua renúncia.
O que significa, do ponto de vista político, a presidência de Feliciano?
Segundo Renzo Taddei, doutor em antropologia pela Universidade de Columbia e professor de Antropologia na Escola de Comunicação (ECO-UFRJ), a presidência de Feliciano marca o atual cenário político brasileiro. Para o professor, em primeiro lugar, demonstra que os partidos estabelecem amplas alianças partidárias para alcançarem e se manterem no poder, estratégia chamada de presidencialismo de coalizão em ciência política. Além disso, representa o avanço da bancada evangélica na política nos últimos anos e uma intenção, que, geralmente, passa despercebida. “Há, entre as lideranças políticas evangélicas, a agenda declarada de ocupar todos os cargos possíveis a fim de barrar a aprovação de legislações que vão contra os preceitos morais que defendem. O próprio Feliciano, por exemplo, afirma estar lá para barrar a aprovação do PL 122, projeto de lei que criminaliza a homofobia”, explica.
Contudo, o antropólogo ressalta a fragmentação da bancada evangélica, no que desrespeita as questões políticas. Na sua visão, esse grupo concorda apenas em relação ao aborto e aos casamentos de pessoas do mesmo sexo. Por último e não menos importante, simboliza o descaso do governo Dilma com os direitos humanos e minorias. A falta de diálogo e consideração com as chamadas populações tradicionais, como os indígenas da Aldeia Maracanã, evidencia essa postura. “O governo Dilma reduz, de certa forma, o tema dos direitos humanos. Vale mencionar que ele foi criticado pela Anistia Internacional e pela Human Right Watch, duas entidades de renome na área”, afirma.
Crise de legitimidade do Estado e politização dos jovens
Taddei ainda aproveita para apontar a dimensão do problema: a crise de legitimidade do Estado. De acordo com ele, essa crise alcançou níveis catastróficos, particularmente no parlamento, ilustrado pela presidência de Renan Calheiros no Senado e Marco Feliciano na CDHM, políticos que dão performances públicas lamentáveis à população brasileira. Por outro lado, o doutor consegue ver um aspecto positivo nesses absurdos que se repetem na política nacional. “Tenho a impressão de que essa controvérsia toda, somada a outros conflitos como o de Belo Monte, o dos índios Guarani Kaiowá e os da Aldeia Maracanã e demais remoções desumanas que ocorrem no Rio de Janeiro, está inserindo os jovens no mundo da política. Isso destrói a falsa ideia de que a população só pode participar da política por meio de partidos políticos e eleições”, observa.
Importância das redes sociais
Por fim, embora julgue que o parlamentar do PSC não vá mudar sua linha de ação, o professor salienta a necessidade de a sociedade civil transformar esse fato em algo que produza desgaste político a Dilma e ao PSC. Para isso, as redes sociais são de extrema importância, uma vez que elas consistem em um mecanismo de propagação de ideias. “As redes sociais têm papel fundamental na circulação de informações, que, em geral, não aparecem na mídia tradicional. Além disso, a própria forma como as informações existem nas redes sociais é um diferencial, pois boa parte delas circula como um dado, uma declaração de apoio à causa, uma convocação à ação, tudo ao mesmo tempo.”
O antropólogo, porém, pondera que tudo isso não significa que não há um lugar no parlamento para Feliciano, porque seria uma atitude completamente antidemocrática. “O contrassenso é ter um líder de comissão, cuja agenda é impedir justamente que ela funcione, o que fica evidente quando se trata de Marco Feliciano”, finaliza.